É preciso fazer o Brasil voltar para o mundo

Por Guilherme Coelho 

Publicado em 11 de setembro de 2022 no jornal O Globo

Não teve golpe, não vai ter golpe, e o Bolsonaro vai cair de maduro.
Na verdade, “cair de maduro” é a expressão errada aqui. Bolsonaro será “deseleito” por suas delinquências na saúde, no meio ambiente, na educação, na segurança pública — e principalmente na economia. Seu governo nos custou uma fortuna em desvalorização cambial e financeira.
Hoje, o dólar vale 35% a mais do que o Real, comparado ao que valia quando ele assumiu em janeiro de 2019. Neste mesmo período, a bolsa de valores brasileira (em USD) perdeu de lavada para a dos EUA: -9% contra +62%. Tomamos um banho também para as bolsas pelo mundo, medidas pelo índice MSCI World: -9% contra +40%. Isolando apenas as bolsas de países emergentes também apanhamos: -9% nós, contra +0,4% deles.
Todo mundo viveu a pandemia, e todo mundo está sofrendo as consequências da guerra na Ucrânia. O nosso desempenho é injustificável, mas é compreensível. Esta semana, Bolsonaro está na capa da Economist, mais uma vez queimando nosso filme, nosso dinheiro, nossas oportunidades, e parte do nosso futuro.
Bolsonaro será responsabilizado pelas 75 mil mortes por Covid que foram diretamente causadas por sua prevaricação no atraso da contratação da vacina — mas perderá a presidência por ser um “ruim de serviço”, como recentemente um líder agro o definiu.
Já Paulo Guedes, como “superministro”, foi de palestrante de campanha a um frasista pobre, sem ciência  — ou influência. Alijado da Reforma da Previdência por brigas com o então presidente da Câmara, Rodrigo Maia, Guedes foi igualmente escanteado na negociação da Reforma Administrativa, tendo sido preterido por Bolsonaro, que delegou em seu lugar uma turma da Polícia Rodoviária Federal, de dentro do Palácio do Planalto. Infelizmente, unicamente corporativista.
A dinâmica foi diferente na questão tributária. Guedes chamou o jogo para si, e com tanta coisa pra fazer, brigou com todos e ao final tinha como Reforma Tributária a volta da CPMF. Ruim de serviço.
O Governo Bolsonaro foi um desastre, e é importante termos isso tatuado nos braços. E devemos historiografar a gestão de Guedes, para não repetirmos o que já se sabia que daria errado. “Não há negócio bom com gente ruim, nem negócio ruim com gente boa”. Esta é a mais precisa frase para guardarmos sobre estes últimos quatro anos. Nós, com acesso à informação, não devemos nunca mais esquecer que quem avaliza um delinquente, delinquente também o é.
Assim foi a nossa recente experiência com a extrema-direita. Um desastre pra tudo quanto é lado. Consequentemente o tal golpe do Bolsonaro não teve mais apelo entre nós. Virou apenas uma ótima série do Porta dos Fundos.
Não vai ter golpe; vai ter eleição; e tudo indica que quem vai ganhar é o Lula. Devemos esquecer a sucessão do trono inglês; esquecer o Bolsonaro; e trabalhar desde já em substanciar as propostas do próximo governo. Focar inicialmente numa racionalização tributária que acabe com a regressividade do nosso sistema de impostos e isenções. Essa é a nossa alavanca mais rápida para permitir um maior e melhor crescimento econômico.
Em seguida, devemos avançar numa transformação da governança pública brasileira, por meio de melhores práticas em gestão de pessoas que trabalham em governos. Estas pessoas fazem a diferença nas nossas vidas. E se estiverem melhor organizadas, alinhadas e reconhecidas, vão fazer cada vez mais por nós.
Cabeça erguida, passado o sufoco, não devemos perder ainda mais tempo. E preciso fazer o Brasil voltar pro mundo. Um mundo muito mais desafiador do que há vinte anos. E também cheio de oportunidades para um país verde.
SELVA!

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